Os descongestionantes nasais, famosos por desentupir quase que instantaneamente o nariz, podem não ser tão benéficos quanto se imagina. O produto causa uma rápida dependência e, a longo prazo, traz riscos à saúde.
É importante entender que o nariz entupido acontece quando há uma vasodilatação – os vasos se enchem de sangue – na região, o que dificulta ou impede a passagem do ar. Os descongestionantes, portanto, agem de forma oposta, como vasoconstritores (diminuem o calibre dos vasos).
"Os descongestionantes funcionam diminuindo a circulação de sangue na parte interna do nariz e, consequentemente, murchando as estruturas internas. Isso aumenta o espaço para o ar passar, o que traz alívio para respirar melhor", explica Márcio Salmito, otorrinolaringologista da Unidade Campo Belo, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.
Porém, quando o efeito do medicamento passa, desencadeia uma "vasodilatação rebote".
"Você fica mais entupido do que você estava antes. O grande problema desse remédio é que ele tem uma uma propriedade chamada taquifilaxia, que é você meio que 'acostumar' com ele, ou seja, começa a precisar de doses cada vez maiores para conseguir o mesmo efeito – é o que acontece com a maioria das drogas", explica Fabrizio Romano, médico especialista da Aborl-CCF (Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial) e otorrinolaringologista do Hospital Moriah.
Segundo Salmito, isso ocorre porque, "como o medicamento força a redução da circulação sanguínea de forma artificial, o corpo passa a aumentar a produção das substâncias que causam obstrução durante o tempo de efeito. Quando o efeito do remédio passar, a quantidade de substâncias geradoras de obstrução nasal estará maior do que antes do uso do remédio".
Basicamente, isso significa que a vasodilatação acontecerá de forma mais intensa do que antes e, por essa razão, a pessoa continua usando o medicamento.
"[Primeiro] a pessoa fica 12 horas desentupida, Aí ela [passa a] ficar 10 horas, depois 8 horas, depois 6 horas [e assim por diante]", exemplifica Romano, sobre o processo de dependência.
Não há uma período de uso pré-definido que caracteriza o vício. Mas, quando o paciente precisa usar o descongestionante diariamente, mesmo sem uma doença nasal diagnosticada ou um quadro de gripe, por exemplo, já está dependente.
De acordo com Romano, o período máximo que uma pessoa deve usar o produto é de três a quatro dias, em exceções, cinco dias.
"Mais do que isso o paciente já começa a ficar um pouco dependente do remédio", alerta.
Quando o uso excede esse prazo, merece uma atenção. Outro ponto importante é não é o tempo de utilização que determina os efeitos adversos, mas a dose e a quantidade de vezes ao dia – além das características pessoais de saúde.
"O efeito negativo mais direto do uso prolongado dos descongestionantes é justamente a chamada rinite medicamentosa, que nada mais é do que o problema obstrutivo nasal provocado pelo uso do medicamento. Com o uso de doses maiores, os riscos também vão aumentando, e podem surgir mais frequentemente arritmias (já que são medicamentos semelhantes à adrenalina), e complicações locais, como ressecamento e ferimentos dentro do nariz", afirma Salmito.
Romando ainda complementa que o produto também pode causar aumento da pressão arterial (hipertensão); da frequência cardíaca (taquicardia) e da pressão intraocular; retenção urinária e insônia.
O especialista deixa claro, no entanto, que para ter essas reações mais graves "tem que usar muito" o remédio, porque quando usado "no nariz a quantidade que vai para o sangue é muito pequena".
Porém, pacientes que já têm, por exemplo, problemas cardíacos, não devem cogitar o uso desses remédios, pois correm sério risco de ter uma descompensação.
Os descongestionantes que têm corticoide na fórmula são os mais perigosos. A substância, por si só, causa um efeito sistêmico no organismo e pode desencadear alterações em diversos órgãos.
Entre os efeitos colaterais do uso prolongado estão inchaço no rosto, níveis elevados de açúcar no sangue e afinamento dos braços e pernas.
"Já tive alguns pacientes que tiveram, inclusive, a síndrome de Cushing, que desenvolvem uma série de problemas de saúde pelo excesso de corticoide, só por conta desses remédios no nariz", alerta Romando.
O especialista deixa claro que isso não acontece com spray de corticoide, usado para tratar rinite e sinusite. O problema são os produtos em gota, que têm concentrações maiores da substância.
Há várias alternativas aos descongestionantes nasais, como a lavagem nasal com soro fisiológico e descongestionantes sistêmicos – comprimidos ou sprays com ação anti-inflamatória e desobstrutiva.
"Mais do que buscar uma alternativa ao descongestionante nasal, o ideal é buscar o acompanhamento médico para tratar a doença que causa obstrução nasal. Se a obstrução é causada por uma rinite crônica, deve-se tratar a rinite crônica, seja com medicamentos, hábitos ou terapias imunológicas, sempre com orientação médica. Por outro lado, se o problema é anatômico, como um desvio do septo nasal, pode ser necessária uma cirurgia de correção", orienta Salmito.
Romando complementa que "se for só o vício do remédio, o que fazemos é substituir ele por uma dessas outras alternativas que não tem risco [por cerca de duas a três semanas], para ele sair do período de abstinência".
*Sob supervisão de Fernando Mellis
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