A Polícia Civil de Campinas investiga um ataque racista com tentativa de sequestro realizado por um suposto grupo de motociclistas em um bar frequentado por jovens negros, no distrito de Barão Geraldo. O Bar do Ademir, onde aconteceu o episódio, fica em frente a uma unidade do Programa Moradia Estudantil, que atende estudantes da Universidade de Campinas (Unicamp), fora dos limites do câmpus universitário.
O ataque aconteceu no último dia 6, por volta das 22 horas, quando o DJ Eugênio Rodrigues, conhecido como DJ ORosa, se apresentava no local. Segundo testemunhas, um grupo formado por quatro pessoas, três delas armadas, chegou ao local em um carro preto e tentou obrigar um funcionário do bar, um homem negro, nascido em Guiné-Bissau, país africano, a entrar no carro. O homem, que trabalha como garçom, resistiu.
Eles começaram a xingar o garçom e fazer gestos imitando macaco. Ainda de acordo com as testemunhas, os invasores apontaram as armas para os frequentadores do local e deram três tiros para o alto, mas ninguém se feriu. O dono do bar, identificado como Marcos, foi agredido com tapas.
De acordo com relatos de testemunhas, três dos agressores usavam coletes com insígnias de um clube tradicional de motociclistas. Ainda segundo os relatos, pelo menos um dos homens vestia um colete com a suástica nazista e a bandeira do exército confederado dos Estados Unidos, que lutou contra a libertação dos escravos durante a Guerra da Secessão americana. O DJ ORosa, que é negro, confirmou à polícia que os invasores o ameaçaram com uma arma e o xingaram com palavras racistas.
Em sua rede social, ele fez referência ao episódio. “Eu estava tocando, eu sou DJ, e parou um carro preto com três pessoas dentro, vestidas de preto com os símbolos do Abutres, de motoqueiros, motociclistas, sei lá… E arrumaram confusão com um rapaz guineense que trabalha lá na frente, no bar, e quando a gente foi pra apaziguar e ver o que estava acontecendo, um dos caras do carro tirou uma arma e apontou pras pessoas e deu três tiros para o alto. Depois disso, ele apontou a arma para mim, e eu corri”, escreveu.
Segundo ele, depois de arrumar mais confusões, eles entraram no carro e foram embora. “O que acontece é que algumas pessoas relataram que eles estavam com alguns símbolos neonazistas… O fato é que eles apontaram armas para pessoas negras e, enfim, eu estou bem, mas a gente não sabe qual era realmente a intenção daquelas pessoas ali”, postou.
Uma testemunha que estava em frente à moradia dos estudantes, e que pediu para não ser identificada, disse que estava havendo um evento de forró no bar, quando os homens chegaram em um carro preto. “Eles chegaram com roupas de motoqueiros, alguns casacos com a suástica, eram brancos e ali rolava um evento com pessoas negras. Achei estranho. Depois vi que eles arrumaram uma briga porque um garçom negro, parece que é guineense, foi servir eles. O dono do bar, o Marcos, foi tentar resolver a situação na conversa, mas acabou levando uns tapas”, disse.
Segundo a testemunha, uma das pessoas do grupo sacou uma pistola, que parecia ser uma Glock, e ameaçou quem estava no bar. Antes de subir no carro, essa pessoa deu três tiros para cima. Ainda segundo ele, houve pânico e a polícia foi chamada. “Vi cinco viaturas chegando, mas o grupo já tinha fugido no carro. Depois disso, o bar fechou.”
Em publicação, no dia seguinte, em sua rede social, o Bar do Ademir fez referência ao episódio. “Infelizmente na data de ontem presenciamos aqui no Bar do Ademir um ato de agressão envolvendo funcionários do bar. Pelo relato dos envolvidos e testemunhas, trata-se de um ato racista e covarde por parte dos agressores. Repudiamos qualquer tipo de racismo e preconceito e estamos tomando as devidas providências. Agradecemos a todos pelas mensagens de apoio”, postou.
Procurado pela reportagem, o dono do Bar do Ademir, Marcos Souza, informou que confia no trabalho da polícia, que investiga o caso. Também procurado, o Moto Clube “Abutres: Raça em Extinção” ainda não deu retorno. Em rede social, referindo-se ao ocorrido, o grupo de motociclistas escreveu ser “totalmente contra qualquer tipo de discriminação racial ou religiosa, muito menos a apologia de qualquer crime ou discurso de ódio”.
A Unicamp informou que o evento teria acontecido fora dos limites do câmpus e não tem nada a ver com a universidade.
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo informou que o caso está sendo investigado pelo 7.º DP de Campinas e um dos autores do ataque já foi indiciado. Por conta da natureza do crime, o inquérito segue em sigilo.